Assista e faça download: @Emicida lança “Dedonaferida”, single + clipe

“Como Um Tapa Na Cara”

Emicida lança “Dedonaferida”, single + clipe ,que reflete sobre as tragédias cotidianas da atualidade e manda recado singelo aos donos do poder: “foda-se suas leis, foda-se você!”

Por Arthur Dantas

Na geração mais recente e atuante de artistas hip hop, você encontra de tudo um pouco, desde o cronista urbano ébrio por excelência – Ogi -, ao MC que leva sua bagagem rap para outros formatos e causa furor, como o Criolo, por exemplo. Uns revolucionam o gangsta com tempero local e um ou dois ases na manga – como Don L. -, e tem até os que encarnam com perfeição a boa e velha tradição do cavaleiro solitário que segue adiante apesar de tudo e todos, como o Kamau. Mas além de todas as virtudes comumente atribuídas ao Emicida nos meios de comunicação (sobretudo, a do cara que renovou o público de rap e recriou a altivez do gênero), a que me chama mais a atenção é o amadurecimento explícito através de seus trabalhos e intervenções como figura pública. Sua nova faixa, “Dedonaferida”, produzida por seu já habitual parceiro Renan Samam, é um exemplo disso.

“Dedicado às vítimas do [favela do] Moinho, Pinheirinho, Cracolândia, Rio dos Macacos, Alcântara e todas as quebradas devastadas pela ganância”.

[youtubewd]QdvYAjQYdIs[/youtubewd]
A faixa contou com direção de Nicolas Prado – parceiro da Laboratório Fantasma desde que passou a trabalhar com o MC no programa Sangue B, da MTV -, usando imagens dos conflitos recentes retiradas da internet, além de captação doeEmicida e DJ Nyack, direto do [bairro] “Cachoeira, laje da dona Jacira, mais precisamente”, como informado pelo produtor e irmão do MC, Evandro Fióte.

O beat pesado, emulando a era de ouro do rap mais politizado, tanto estadunidense quanto brasileiro, parece feito sob encomenda.  Pergunto para o rapper se o beat foi feito sob encomenda como imaginava e descubro o engano: “Ele me mandou, eu ouvi aqui e escrevi um dia, do nada.”E porque decidiu ser mais explícito nessa letra é o que pergunto na sequência: “Acho que a abordagem tinha que ser essa, isso tem que soar como um tapa na cara”.

Lembro da expressão “tapa na cara da burguesia”, que de tão mal empregada e desgastada, virou inclusive piada em clipe clássico(http://www.youtube.com/watch?v=osIx2eCbk-c) da trupe do extinto programa de humor Hermes e Renato. A letra, cheia de imagens violentas (TV cancerigena,
aplaude prédio em cemitério indígena. / Auschwitz ou gueto? Índio ou preto? / Mesmo jeito, extermínio, / reportagem de um tempo mau, tipo Plínio), vai preenchendo a batida pesada e mostra uma faceta pouco exercitada pelo MC.

Tratando de repressão policial, mídia tendenciosa e conflitos sociais, o MC não se esquivou de tratar das políticas do cotidiano e expôs a perplexidade diante de uma opinião pública que cada vez mais se adequa à pensata de famoso poeta alemão, que diz “do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento / mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem”. Confira rápido bate-papo com Emicida e o clipe logo abaixo:

Tem espaço ainda pro rap ser a “CNN do gueto”, como diz [líder do Public Enemy] Chuck D.?
Sempre vai ter. O dia que este tipo de rap não existir mais, o rap morreu – isso nem é um pensamento meu, olha a última do Mos Def (http://www.youtube.com/watch?v=nFg7-4vBPWM) , olha o disco do Common… Os caras se ligaram que tem coisa séria que precisa ser dita ainda, por nós e pros nossos.

Em São Paulo, em particular, vive-se uma espiral de violência estatal e indiferença da população civil. No teu blog, quando você escreveu sobre Pinheirinho, muita gente chiou ou até estranhou seu posicionamento ao lado de quem foi expulso. Isso te assusta na real? Como você se sente diante disso?
Acho comum, infelizmente. O Brasil tem um histórico do povo ser colocado contra o povo e abraçar a causa da “elite”: olha pro caso da USP, olha a favela do Moinho, a situação dos quilombolas, do MST, de todas as famílias sem ter onde morar… embora esta parcela da população seja gigantesca, a mídia faz com que o povo pense que são baderneiros, “maconheiros” (esta palavra que porcamente trouxeram de volta em pleno século 21). O que me assusta é a apatia das pessoas perante estas situações: você está assistindo o governo solucionar um problema de moradia com a Tropa de Choque agredindo mulher com criança de colo e acha que é isso que deve ser feito? Na hipótese mais bizarra, o Estado ainda estaria errado pela forma como trata as pessoas. Me sinto no meio de tudo isso como um peixe nadando contra a maré – sempre fui isso. Mas acho um bom teste pro rap também, no momento de exposição gigantesca e egocentrismo extremo, vamos ver quais temas ainda são relevantes… Me sinto na obrigação de dizer isto, até pela quantidade de pessoas que me ouvem. Minha música é produto do que meu coracão me permite ver, nem sempre vai ser pra sorrir, fico preocupado com gente se tornando inimiga de seus vizinhos, em função de noticias de uma imprensa vaidosa, que funciona de acordo com seus próprios interesses.

A letra do Racionais MCs que diz “não confio na polícia, raça do caralho” continua valendo em 2012?
Infelizmente, sim.

Escute, baixe e comente a música:

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Ficha técnica:

Música: Dedo na Ferida
Artista : Emicida
Beat: Renan Samam
Scratches: Dj Nyack
Captação e Edição: Nicolas Prado
Arte: Shock
Mixagem e Masterizacão: Bruno Pompeo

agradecimentos especiais:
Herbert do Sindicato dos metalurgicos de SJC pelas imagens internas do pinheirinho.

Dedicado a todos os focos de resistência popular que dia após dia, sofrem perante a ganância de corporações e empresários.

 

Letra:

scratchs ( pimenta nos zóio dos politicos )
Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs ( a fúria negra ressuscita outra vez )
Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs ( anota meu recado)
Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs ( primeiro eu quero que se foda )
Renan Samam, Emicida, o rap ainda é o dedo na ferida…

Vi condomínios rasgarem mananciais
a mando de quem fala de Deus e age como Satanás.
(Uma lei) quem pode menos, chora mais,
corre do gás, luta, morre, enquanto o sangue escorre –
é nosso sangue nobre, que a pele cobre,
tamo no corre, dias melhores, sem lobby.
Hei, pequenina, não chore.
TV cancerigena,
aplaude prédio em cemitério indígena.
Auschwitz ou gueto? Índio ou preto?
Mesmo jeito, extermínio,
reportagem de um tempo mau, tipo Plínio.
Alphaville foi ilusão, incrimine-os
Grito como fuzis, Uzis, por brasis
que vem de baixo, igual Machado de Assis.
Ainda vivemos como nossos pais Elis
quanto vale uma vida humana, me diz?

Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs ( a furia negra ressuscita outra vez )
Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs ( anota meu recado)
Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs ( primeiro eu quero que se foda )
Renan Samam, Emicida, o rap ainda é o dedo na ferida…

É só um pensamento, bote no orçamento
nosso sofrimento, mortes e lamentos,
forte esquecimento de gente em nosso tempo
visto como lixo, soterrado nos desabamento
em favela, disse Marighella. Elo
contra porcos em castelo
o povo tem que cobrar com os parabelo
porque a justiça deles, só vai em cima de quem usa chinelo
e é vítima, agressão de farda é legítima.
Barracos no chão, enquanto chove.
Meus heróis também morreram de overdose,
de violência, sob coturnos de quem dita decência.
Homens de farda são maus, era do caos,
frios como halls, engatilha e plau!
Carniceiros ganham prêmios,
na terra onde bebês, respiram gás lacrimogênio.

Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs (a fúria negra ressuscita outra vez)
foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs (anota meu recado)
Foda-se vocês, foda-se suas leis!
scratchs (primeiro eu quero que se foda)
Renan Samam, Emicida, o rap ainda é o dedo na ferida.

 

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