Moradores protestam contra chacina no Campo Limpo
Por Lino Bocchini / Fotos Jennifer Glass e Olegário A. Filho (Fotógrafos/Overmundo)
Ato em memória dos 7 Mo jovens executados no Campo Limpo reúne 500 moradores. Nenhuma autoridade deu as caras
Embaixo de uma chuva fina, cerca de 500 moradores da região do Campo Limpo participaram da caminhada e da missa em memória aos sete jovens executados na madrugada de 5 de janeiro, o primeiro sábado de 2013. O ponto de encontro foi na rua Reverendo Peixoto da Silva, a poucos metros do bar onde aconteceu a execução. Depois de cerca de uma hora caminhando pelas ruas do Jardim Rosana, aconteceu uma missa de sétimo dia em homenagem a Brunno de Cássio Cassiano Souza (17 anos), Carlos Alexandre Claudino da Silva (27 anos), Ricardo Genuíno da Silva (39 anos), João Batista Pereira de Almeida (34 anos), Edilson Lima Pereira Santos (27 anos), Almando Salgado dos Santos Júnior (41 anos) e Laércio de Souza Grimas (33 anos), o rapper DJ Lah.
Durante todo percurso, o grito mais ouvido, em coro, foi: “Governador / preste atenção / tem um grupo de extermínio em ação”. Segundo testemunhas que conversaram coma imprensa, os criminosos gritaram “Polícia!” antes de abrir fogo. E, de acordo com os jornais, os moradores são unânimes em afirmar que houve participação de policiais no crime. O governador Geraldo Alckmin prometeu “apuração rigorosa” mas, até agora, nenhum suspeito foi apresentado. Enquanto isso, a segunda chacina do ano já aconteceu, em Guarulhos, na madrugada desse sábado (12/01), onde mais 3 jovens foram mortos. No ano passado, 24 chacinas ocorreram na Grande São Paulo (somando 80 mortos) e a polícia desvendou os autores deapenas uma delas.
O ato desse domingo foi convocado pelos moradores, e teve apoio de entidades locais como a Quadra do Doca (onde foi a concentração), a Capão Cidadão, que oferece aulas de dança, artes e reforço escolar para as crianças da região, e a Agência Cultural Solano Trindade, que criou um banco comunitário com moeda própria –os “solanos”– através do qual várias ações culturais são financiadas na região. A paróquia Santa Isabel, que fica a 200 metros do local do crime, também esteve à frente da convocação. Vale registrar que tanto a Capão Cidadão quanto a Agência Solano Trindade desenvolvem um trabalho importante na região e estão, ambas, com seus trabalhos de 2013 seriamente ameaçados por absoluta falta de dinheiro.
Secretários ausentes
Alguns dos articuladores do evento de hoje estiveram na posse do secretário municipal de Direitos Humanos, Rogério Sotilli, que aconteceu na última sexta-feira. Nessa ocasião, a dois dias do ato, o secretário prometeu a eles que estaria presente na manifestação do Campo Limpo. Não foi. O secretário da Promoção da Igualdade Racial Netinho também estava presente na posse de Sotilli e também prometeu aos organizadores que iria ao Campo Limpo apoia-los no domingo. Também não foi. Sotilli e Netinho não foram os únicos ausentes: nenhuma autoridade do poder público municipal, estadual ou federal foi ao ato ou mandou representante. Nenhum vereador, deputado, secretário…nada. Havia inclusive propaganda política de pelo menos 4 vereadores eleitos num raio de 2 quarteirões do bar onde a chacina aconteceu. E nenhum deles se dignou a ir até lá. Havia até um documento da população que seria entregue às autoridades, mas elas ignoraram a manifestação dos moradores.
Em vez de ficar condenando a falta, lideranças locais já fizeram uma sugestão concreta aos secretários: fazer uma audiência pública conjunta das duas pastas no Campo Limpo, para ouvir a população e os movimentos sociais locais. E que essa audiência aconteça com urgência e seja transmitida ao vivo pela internet.
Em consideração à situação de extrema falta de segurança da população local, esse texto não cita o nome de nenhum morador.
E fica aqui a lembrança e o convite futuro: um ato tão importante como esse não poderia contar apenas com a presença da comunidade local, como aconteceu. A cidade é uma só.
Bar onde os sete jovens foram chacinados, na rua Reverendo Peixoto da Silva, 75
Panfleto distribuído durante a manifestação. Nós concordamos com cada palavra
Na vida real, as estatísticas têm nome, rosto e filhos
Papo reto nas grades da paróquia Santa Isabel: “E se fossem 7 mortos no Higienópolis” e “Alckmin: Cadê você?”
*Texto Originalmente publicado no site Desculpe Nossa Falha