RAP x RAP – Ponto pro Sistema – Por Alessandro Buzo
Por: Alessandro Buzo
Música é universal.
Claro que tem música boa e música ruim. Mas o que é bom pra VC pode não ser pro seu amigo, seu vizinho, enfim…. pra outra pessoa.
O princípio da sabedoria e boa convivência é VC respeitar o proximo.
OK, VC respeita ? Então tem todo o direito de não gostar, basta simplesmente respeitar.
Música é igual futebol.
Que graça teria se todos torcerem pro mesmo time ? Nenhuma.
De quem a gente vai tirar barato, de quem a gente vai dizer que esse ano o meu foi melhor que o seu, desfilar com orgulho com a camisa.
Mas precisa respeitar, porque ficar brigando na rua, no metrô, se matando…. enquanto os jogadores estão milionários, de carro importado não vira.
Então respeitando que eu sou PALMEIRENSE e o outro é corinthiano, santista, são paulino…. tendo respeito, tirar um barato faz parte da graça do futebol.
Mas o assunto aqui é música e não esporte.
Lembro de uma cena, eu tinha machucado gravemente minha perna no engate do trem (LINHA VARIANT na Zona Leste de SP, hoje Linha F), estava em casa de atestado.
Era Office Boy no escritório (contabilidade) de um conhecido do meu pai.
Estava de repouso e afastado a uma semana.
No sábado (segunda ainda não voltaria)…. véspera do dia dos pais, fui do Itaim Paulista até São Miguel (de BUZÃO), pra comprar o presente do meu pai, o comércio do Itaim era fraco na época e esse tipo de coisa, presente, a gente comprava ou em São Miguel ou no Brás.
Quando voltei, com o viníl SERTANEJO 86 pra presente, foi eu entrar em casa e meu pai falou um monte, que eu estava doente pra trabalhar, mas pra sair eu não estava, que eu isso, aquilo.
Nem esperei o domingo, sábado mesmo, naquele momento, eu dei o presente: – Só fui ali comprar o presente do Dia dos Pais.
Ele pediu desculpa, mas marcou. Menos do que anos seguintes que ele foi embora e no dia dos pais só tinha um vazio, esses outros vários anos doeu mais que 1986.
Nessa época a gente comprava viníl, não existia CD ainda.
Nem DVD, era só VHS e como sempre fui pobre, nunca pude comprar um vídeo cassete, era artigo de luxo.
Muita gente no Itaim Paulista onde eu morava, comprava disco de novela da Globo.
Os NACIONAIS porque tinha as musicas da moda e os Internacionais porque tinha as música lenta que a gente dançava nas festinhas de aniversário da Rua 5 no Jardim Olga.
Quantas menininhas eu ganhei xavecando durante a lenta.
Eu comprava samba e rock. Almir Guineto, Zeca Pagodinho. Ultraje a Rigor.
Gostava dos dois ritmos, rock nacional (ou não) e samba.
Titãs, IRA, Barão Vermelho, Kid Abelha. Leci Brandão, Fundo de Quintal.
Cheguei a ir em shows de ROCK, Guns Roses no Anhembi, Hollywood Rock no Morumbi, show do Golpe de Estado. Samba eu vi nessa época ao vivo, o FUNDO DE QUINTAL uma vez no Texaco do Itaim.
O Hip Hop e o RAP nem existia.
Eu odiava sertanejo. Funk carioca e o original, não conhecia nenhum dos dois.
Por muitos anos eu fui radical, criticava o que eu não gostava, geralmente forró e sertanejo.
Quando venho os NOVOS SERTANEJOS, descobri que gostava dos antigo que meu pai ouvia, Tião Carrero e Pardinho, Milionário e José Rico entre outros.
O novo era o que levaria o sertanejo pra todo país, inclusive pras capitais como São Paulo.
Mas o novo sertanejo nunca me agradou.
Com o samba foi a mesma coisa, o de raiz, o partido alto, ficou um tempo pra escanteio e surgiram dezenas ou centenas de grupos de pagode. A maioria ruim e eu não curtia.
Uma vez, lendo a entrevista da Leci Brandão na RAP BRASIL, comecei a refletir.
Ela disse que não era chegada nesse novo pagode, mas que depois que eles surgiram, elevou o nível dos cachês, dos translados (avião, van), das hospedagens. Eles deram uma roupagem nova as contratações e a velha guarda estava se beneficiando disso.
Conheci de fato o Rap, quando saiu o CD “Sobrevivendo no Inferno” dos Racionais Mc´s e o CD USUÁRIO do Planet Hemp.
Não vou ficar pagando que era da São Bento que eu não era.
Quando esses dois cd´s me chamaram a atenção eu passei a ouvir RAP e fui descobrindo um monte de outros grupos.
Antes todo mundo me dizia que era música de bandido.
Um mundo surgiu pra mim. Esses artistas do RAP cantavam o que eu vivi a vida toda no Itaim Paulista (anos 70, 80 e 90), eles falavam a minha língua e eram mais proximos, dava pra ir nos shows, conhecer alguns deles.
As bandas de Rock Nacional que eu curtia eram muito distantes.
O Rap era ali do lado, tinha grupo até do Itaim Pta.
O primeiro show de Rap que eu fui, foi na rua em frente a Favela do Boi no Itaim Paulista, só grupos da quebrada cantando em cima de um caminhão, não um trio elétrico, um caminhão desses de depósito de construção, a carroceria era o palco e o som precário.
Comecei a ler tudo que eu encontrava de RAP, que basicamente era o Jornal Estação Hip Hop do Aduanias da Luz (que depois eu conheci) e as primeiras RAP BRASIL (depois cheguei a trabalhar na revista)…. lia tudo e cada vez conhecia mais gente.
No Estação Hip Hop li quando o Mano Brown foi na ABEVIC, uma ONG na Zona Leste. Quem levou ele foi o ELI EFI (DMN), hoje mora nos Estados Unidos.
Nessa época (2001) eu divulgava meu primeiro livro (hoje são dez)… O TREM – BASEADO EM FATOS REAIS.
Chegou na minha mão um panfleto que o MV BILL iria na ABEVIC, eu tinha saído falando do meu livro na Rap Brasil numero 7, com MV BILL na capa. Desde então (li toda a revista, inclusive a entrevista do Bill), era louco pra conhecer ele e o BROWN.
Decidi que iria na ABEVIC e chamei um mano pra ir comigo (Carlinhos do Boné), fomos de condução, duas van que era meio fora de mão.
Chegamos lá conheci o ELI EFI e percebi o quanto ele era influente e articulado, dei um livro de presente pra ele. Mas o MV BILL tinha cancelado. Na verdade o show que ele faria em SP cancelou e na ABEVIC era um corre extra, aproveitando o show.
Voltei chateado de não ter conhecido o BILL, mas feliz de ter conhecido o ELI EFI.
Fui me envolvendo no RAP.
Fiquei amigo do RZO porque meu livro do trem tinha a letra da música O TREM do RZO, o Sandrão até foi no lançamento (dez/2000), sem eu ser nem conhecido na cena.
Passei a frequentar a LAJE DA CASA DO HELIÃO, que foi minha faculdade de RAP.
Lá conheci grandes nomes do Rap Nacional, a FAMÍLIA RZO era grande.
Paralelo a isso, fiquei amigo do Tribunal Mc´s (junto com o Alerta Vermelho, os principais grupos de RAP do Itaim), nessa época foi a melhor formação do TRIBUNAL com Frann, Du Loko, Ronaldo e DJ (Law, Da Antiga), back vocal de MOLA e 16.
Fui em muitos shows do Tribunal Mc´s, cheguei a trabalhar com eles, assessoria e venda de shows.
Hoje praticamente conheço “quase” todo mundo que faz RAP, conheci os grandes nomes e sou amigo pessoal da maioria. Nem vou cittar nomes, mas quase todos mesmo.
Vi o auge do RAP, shows lotados, tocando sem parar na quebrada.
Sempre reprimido e forte, quanto mais reprimia, mais forte ficava.
O Facção Central surgiu com força a partir do momento que PROIBIRAM (Ministério Público) seu vídeo clipe por APOLOGIA AO CRIME, mostrava cenas de sequestro relampagos.
A mídia não falava de RAP e quando falava era pra criticar.
Pra uma grande maioria de grupo, o RAP nunca deu dinheiro e isso afastou alguns.
Tinha pouca mulher nos eventos de RAP e isso afastou outros, tinha muita polícia enquandrando quando tinha show, perdiamos mais alguns simpatizantes.
Teve também a febre de todo moleque que curtia RAP querer montar um grupo e existia milhares de grupos e claro que muitos sem condições, sem talento. Outros nem tão ruins, mas era grupo demais, muito grupo pra poucos show e claro que não teria como todo mundo ganhar dinheiro com o RAP.
O tempo do auge passou e venho a crise, o RAP deu espaço pra outros estilos na quebrada, vieram ritmos modinhas um atrás do outro, o povo queria LAMBADA, não rima pesada.
Modinhas foram e vieram e o RAP mesmo sofrendo, sobreviveu, porque não era MODA, era uma CULTURA e um MOVIMENTO URBANO e não estava mais só em SP, RJ, DF…. havia ganho todo país.
O RAP sobreviveu.
E de uns 3 anos pra cá, ficou forte de novo.
Além dos monstros sagrados que ainda estão na caminhada, pra citar 10 citaria Racionais Mcs, Realidade Cruel, GOG, Rappin Hood, Z´Africa Brasil, Facção Central, Ndee Naldinho, MV Bill, Dexter, entre tantos outros que seguem revolucionando através das letras, eu mesmo virei escritor inspirado no RAP.
Além desses que sempre irão ter seu espaço, surgiram a nova geração, natural em qualquer movimento que dura a 30 anos.
Essa nova geração não cresceu na periferia dos anos 70, 80…. não enfrentou os mesmos problemas, não morou com esgoto a céu aberto, essa nova geração venho tudo ligada na internet e fizeram dela uma arma poderosa.
O Rap voltou a ser tocado nas quebradas, mesmo competindo com o FUNK PAULISTA (tipo o carioca)….
Fora os enlatados da mídia que nunca deixou de surgir, o novíssimo sertanejo que virou universitário e a porra toda, mas o RAP, mesclando a VELHA ESCOLA da NOVA, conquistou espaço importante nos grandes eventos, na mídia e voltou a ser forte.
A importancia da nova geração não pode ser desprezada, nem o alicerce da velha.
Juntos eles fizeram o RAP FORTE de novo.
Mas, mesmo estando no Século XXI, no ano de 2013, ainda estamos sofrendo.
O que tem roubado a brisa é uma parte do público do RAP que curtia os VELHOS MONSTROS SAGRADOS e não aceita o NOVO.
Fica usando sua força pra postar que fulano é MODINHA, beltrano é VENDIDO, outro é ISSO, o outro AQUILO.
Nós contra nós mesmos é fácil de saber quem perde. NÓS MESMOS.
A elite, o sistema agradece.
Falta respeito, na rede social todo mundo é valente, tem o poder de cobrar.
Eu aprendi a mesmo não curtindo, aceitar que milhares de pessoas gostam de sertanejo, enlatado, forró etc.
Eu não curto, mais respeito.
Se eu respeito quem faz música que eu jamais ouviria por livre e expontânea vontade, mas ouço porque o vizinho ouve, na rua toca. Porque eu não iria respeitar quem é do mesmo time que eu, do HIP HOP, do RAP.
Meu célebro graças a Deus cabe a VELHA e a NOVA geração e consigo ser fã e amigo de vários deles (antigos e novos).
Mas tudo bem….. vc só curte GANSTAR, só curte A e B, OK….. nenhum problema, só respeita o C e o D.
Ficar criticando os novos MC´s com a maioria dos jovens da quebrada ouvindo funk sem conteúdo.
OK, vamos respeitar quem curte.
Precisa misturar pra evoluir, não ficar criticando fulano e beltrano, porque não canta a favela….. ou será que ele canta e vc e seu preconceito nem se deu o trabalho de ouvir.
Ta bom, falta assunto pra vc no FACE e mais fácil é dizer que o CARA TAL é MODINHA.
Não perca tempo com isso e saiba que quem perde é o RAP.
Ontem eu assistia o reprise do Manos e Minas com o PROJOTA, umas novinhas na primeira fila cantavam cada letra, uma delas me chamou a atenção. Ela cantava PROJOTA e vestia bombeta da DRR, quer mais mistura que isso ?
Agora uma pergunta, se ela não curtisse EMICIDA, RASHID, PROJOTA, com certeza (ou quase) elas iria curtir sertanejo ou funk. O RAP iria perder mais um jovem.
ACORDA RAPAZIADA, vamos ser mais RAP e menos BLA BLA BLA.
Se vc só curte os VELHOS, respeita os novos e vice versa, um dia vc acaba vendo que é tudo RAP e cada um tem a sua importancia.
Mas se VC quer criticar alguém, se isso é maior que vc. Abaixo 10 assuntos pra vc criticar.
1 – Bancada da Bala (PM´s eleitos vereadores).
2 – Mensalão
3 – Paulo Maluf
4 – Collor
5 – Saúde pública
6 – Transporte coletivo
7 – Chacinas na periferia
8 – Salário dos políticos
9 – CACHOEIRA
10- LALAU
Só pra citar DEZ….
Você focando sua IRA nesses dez assuntos acima, vai ganhar a sociedade e o RAP ÚNICO agradece.
Deviamos nos preocupar que passei 5 dias (VIRADA DE ANO, 2012/2013) no ESPIRITO SANTO e não ouvi um único rap rolando. Só Gustavo Lima e Cia.
Em todo lugar anunciando MUNHOZ & MARIANO, perguntei pro meu filho quem era eles: – O do CAMARO AMARELO. Quando não era eles era show do CATRA.
Devemos (quem é do RAP) ficar feliz que o DISCO DO ANO de 2012 foi NÓ NA ORELHA do CRIOLO, senão seria Chico Buarque (nada contra) ou ESSE CARA SOU EU do REI, e olha que eu nem sou desse reino, meu REI é o ZECA PAGODINHO. Então como não ficar feliz que o CRIOLO, nascido e criado no Grajaú ganhe o disco do ano.
Ai vem o FRUSTADO dizer que o CRIOLO é VENDIDO, ISSO, AQUILO.
Nóis contra Nóis quem ganha é o sistema.
Alessandro Buzo
escritor
www.buzo.com.br
Transcritos ipsis litteris